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Como a endometriose afeta suas chances de engravidar e o que fazer

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Por que a endometriose pode dificultar engravidar

A endometriose é comum (atinge cerca de 1 em cada 10 mulheres em idade reprodutiva) e está presente em até metade das mulheres com infertilidade. Quando pensamos em endometriose fertilidade, o primeiro ponto é entender como a doença interfere em diferentes etapas da concepção. Ela pode prejudicar a qualidade dos óvulos, dificultar a captação do óvulo pelas trompas, alterar a receptividade do endométrio e gerar inflamação pélvica crônica que afeta o espermatozoide e o embrião.

A inflamação sustentada aumenta substâncias pró-inflamatórias e o estresse oxidativo, que podem atrapalhar a fecundação e a implantação. As aderências pélvicas distorcem a anatomia e limitam o movimento das trompas. Endometriomas (cistos de endometriose no ovário) podem reduzir a reserva ovariana ao danificar o tecido saudável. Além disso, a dor pélvica e durante a relação pode diminuir a frequência de relações sexuais nos períodos férteis, reduzindo a chance de gravidez espontânea.

O que acontece no corpo

Na endometriose, tecido semelhante ao endométrio cresce fora do útero, sangra a cada ciclo e causa inflamação. Esse microambiente inflamatório altera a função dos folículos ovarianos e pode reduzir a competência dos óvulos. O peritônio e as trompas ficam expostos a mediadores inflamatórios que dificultam a captura do óvulo no momento da ovulação.

Há ainda evidências de alterações imunológicas e hormonais locais. A recepção embrionária no útero pode ser menor em alguns casos, principalmente quando há adenomiose associada (endometriose dentro da parede uterina). O resultado é uma soma de pequenos impactos que, juntos, diminuem a probabilidade de gestação a cada ciclo.

Tipos e estágios e o impacto na fertilidade

A doença pode ser superficial (lesões peritoneais), ovariana (endometriomas) ou profunda (infiltração em ligamentos, septo retovaginal, intestino ou bexiga). O estadiamento clássico (I a IV) descreve extensão e gravidade, mas não prevê sozinho a possibilidade de engravidar. Para isso, o índice EFI (Endometriosis Fertility Index) é mais útil, pois combina achados cirúrgicos e fatores como idade, tempo de infertilidade e reserva ovariana para estimar a chance de gravidez espontânea após cirurgia.

Em geral, doença mínima a leve tem menor impacto; doença moderada a grave, especialmente com aderências intensas e endometriomas bilaterais, tende a reduzir mais as chances naturais e pode exigir reprodução assistida mais cedo.

Sinais, diagnóstico e quando investigar

Muitas mulheres são diagnosticadas somente quando decidem engravidar. Reconhecer sinais precoces é valioso para planejar melhor o caminho. Dor menstrual intensa que piora com o tempo, dor na relação, dor intestinal no período menstrual, sangramento intenso e infertilidade são sinais clássicos. Porém, não sentir dor não exclui endometriose, sobretudo quando há dificuldade para engravidar.

De modo geral, casais devem investigar após 12 meses de tentativas se a mulher tem menos de 35 anos e após 6 meses se tem 35 anos ou mais. Se há dor pélvica importante, ciclos muito irregulares, histórico de cirurgias pélvicas, endometriomas conhecidos ou alterações no espermograma do parceiro, vale antecipar a investigação.

Exames que ajudam no diagnóstico

O diagnóstico começa com consulta clínica detalhada e exame ginecológico. Entre os exames de imagem, destacam-se:
Ultrassonografia transvaginal com preparo intestinal: quando realizada por profissional experiente, identifica endometriomas, lesões profundas e aderências indiretas.
– Ressonância magnética pélvica: útil para mapear doença profunda e planejar cirurgia.

Exames laboratoriais como CA-125 podem subir na endometriose, mas não são diagnósticos. A laparoscopia é o padrão-ouro para diagnóstico e tratamento, porém hoje não é mais a primeira etapa para todas; muitas vezes é reservada para dor refratária, suspeita de lesões profundas com repercussão ou quando a estratégia cirúrgica pode melhorar o caminho reprodutivo.

endometriose fertilidade: caminhos naturais e mudanças de estilo de vida

Modificações de estilo de vida não curam a endometriose, mas podem reduzir inflamação, melhorar dor e otimizar o terreno metabólico e hormonal para a concepção. Em especial quando o plano inclui tentativas espontâneas ou inseminação, vale preparar o corpo por algumas semanas.

Alimentação anti-inflamatória e peso saudável

Uma dieta inspirada no padrão mediterrâneo é a mais estudada para condições inflamatórias. Foque em:
– Verduras, legumes coloridos e frutas (5 a 9 porções/dia) para antioxidantes e fibras.
– Gorduras boas (azeite de oliva, abacate, oleaginosas) e peixes ricos em ômega-3 (salmão, sardinha).
– Grãos integrais e leguminosas (feijões, lentilha, grão-de-bico).
– Especiarias anti-inflamatórias (cúrcuma com pimenta-do-reino, gengibre).
– Reduzir ultraprocessados, açúcar, excesso de glúten refinado e carnes processadas.

Manter IMC entre 20 e 25 está associado a melhores resultados reprodutivos. Ganho ou perda de 5% a 10% do peso corporal, quando necessário, já impacta positivamente marcadores metabólicos. Para suplementação, converse com seu médico(a) sobre vitamina D, ômega-3 e coenzima Q10; as evidências variam, mas podem ser úteis em alguns contextos.

Dor, estresse e qualidade do sono

A dor crônica ativa o eixo do estresse e piora a inflamação. Abordagem multimodal faz diferença:
– Fisioterapia pélvica para liberar tensões e melhorar o assoalho pélvico.
– Analgésicos e anti-inflamatórios de curta duração, conforme orientação médica, nos dias críticos.
– Técnicas de manejo do estresse (mindfulness, respiração, psicoterapia) para modular dor e sono.

Durma 7 a 9 horas por noite. O sono ruim pode reduzir a probabilidade de engravidar e piorar a dor. Lubrificantes compatíveis com fertilidade e relações sexuais programadas podem ajudar quando há dor na penetração, preservando a frequência nas janelas férteis.

Estratégias para tentar engravidar sem e com cirurgia

O melhor caminho depende de idade, tempo de tentativas, reserva ovariana (AMH e contagem de folículos antrais), presença de endometriomas, dor e permeabilidade das trompas. A palavra-chave é personalização. Em mulheres jovens, com doença mínima a leve, trompas pérvias e bom espermograma, faz sentido tentar espontaneamente por alguns meses de forma estruturada. Em casos moderados a graves, muitas vezes a reprodução assistida encurta o tempo até a gestação.

Relação programada e coito dirigido

Quando há ciclos regulares, você pode “turbinar” a chance de gravidez com:
– Monitoramento da ovulação (testes de LH, muco cervical, ultrassom seriado, se necessário).
– Relações a cada 1–2 dias nos 4 a 6 dias férteis (dois dias antes até o dia da ovulação).
– Correção de deficiências nutricionais, manejo da dor e hábitos saudáveis descritos acima.

Em algumas situações, o médico(a) propõe indução leve da ovulação com citrato de clomifeno ou letrozol e relações programadas. O ganho é pequeno, mas pode ser razoável por 2–3 ciclos quando há endometriose leve, trompas pérvias e sêmen normal.

Quando considerar cirurgia conservadora

A laparoscopia com excisão de lesões pode:
– Aliviar dor e restaurar a anatomia.
– Aumentar modestamente as chances de gravidez espontânea em doença mínima a leve.
– Facilitar procedimentos de reprodução assistida (acesso ovariano e redução de dor).

Indicações típicas incluem dor refratária, endometriomas grandes (≥4–5 cm), distorção anatômica importante, suspeita de comprometimento intestinal/urinário ou falhas prévias de reprodução assistida. Por outro lado, cada cirurgia em ovário pode reduzir a reserva; por isso, avalie AMH e plano reprodutivo antes de operar endometriomas, sobretudo em quem deseja FIV. Cirurgia com equipe experiente em endometriose é determinante para melhores desfechos e menor dano ovariano.

Tratamentos de reprodução assistida e taxas de sucesso

A reprodução assistida é aliada estratégica quando a endometriose restringe a via natural. A escolha entre inseminação intrauterina (IIU) e fertilização in vitro (FIV) depende do estágio da doença, idade, reserva e tempo de tentativas.

Inseminação intrauterina (IIU): quando usar e limites

A IIU consiste em estimular levemente a ovulação, processar o sêmen para concentrar espermatozoides móveis e colocá-los diretamente no útero no período fértil. Funciona melhor quando:
– A endometriose é mínima a leve.
– Pelo menos uma trompa é pérvia.
– O espermograma é normal ou levemente alterado.
– A mulher tem menos de 35 a 37 anos e tempo de infertilidade mais curto.

As taxas de gestação por ciclo costumam ficar entre 8% e 15% nessas condições, variando sobretudo pela idade. Em geral, recomenda-se tentar 3 a 4 ciclos de IIU antes de migrar para FIV se não houver sucesso. Em doença moderada a grave, a vantagem da IIU cai substancialmente.

FIV, ICSI e preservação de fertilidade

A FIV supera barreiras das trompas e parte do efeito do ambiente pélvico inflamado, por isso é preferida em doença moderada a grave, em baixa reserva ovariana, em endometriomas bilaterais ou após tentativas frustradas. Pontos práticos:
– Protocolos de antagonista com gatilho com agonista reduzem risco de síndrome de hiperestímulo.
– A presença de endometrioma não impede a FIV; decide-se punção ao redor do cisto ou eventual drenagem/excisão caso o cisto atrapalhe acesso ou cause infecção recorrente.
– ICSI (injeção intracitoplasmática de espermatozoide) pode ser indicada quando o sêmen é limítrofe ou há histórico de baixa fecundação.

Taxas de sucesso variam com a idade: em mulheres até 35 anos, a taxa de nascido vivo por ciclo pode ficar em torno de 30% a 40%; entre 36 e 39 anos, 20% a 30%; após 40, cai progressivamente. Endometriose pode reduzir o número de óvulos recuperados, mas, com protocolos adequados, muitas mulheres alcançam gestação. Em alguns casos, considera-se “freeze-all” (congelar todos os embriões) e transferir em ciclo posterior para otimizar o endométrio, especialmente se houver adenomiose.

A preservação de fertilidade com congelamento de óvulos é uma opção valiosa:
– Antes de cirurgias ovarianas, para proteger a reserva.
– Em mulheres jovens com endometriomas bilaterais ou AMH em queda.
– Para quem deseja adiar a maternidade por alguns anos.

Quando a reserva está muito baixa ou houve falhas repetidas, a ovodoação é alternativa segura com elevadas taxas de sucesso, devendo ser discutida caso a caso.

Planejamento personalizado e cronograma de ação

Se você tem endometriose e deseja engravidar, um plano claro reduz ansiedade e economiza tempo. Use sua idade, reserva ovariana, estágio da doença, dor e tempo de tentativas para decidir cada passo. O objetivo é equilibrar endometriose fertilidade com as opções terapêuticas, sem atrasos desnecessários.

O que fazer nos próximos 3, 6 e 12 meses

Próximos 0–3 meses:
– Consulta com ginecologista especialista em endometriose ou reprodução humana.
– Avaliar AMH, contagem de folículos antrais, ultrassom transvaginal detalhado e, se indicado, ressonância.
– Espermograma do parceiro com laboratório qualificado.
– Ajustar hábitos (dieta, sono, exercício) e plano de controle da dor.
– Decidir estratégia: tentativa espontânea estruturada, IIU ou FIV, conforme perfil.

Meses 4–6:
– Tentar até 3 ciclos de IIU se critérios forem favoráveis.
– Se opção for FIV, realizar 1 ciclo e congelar embriões; considerar 1–2 ciclos de acúmulo de óvulos se a reserva for baixa.
– Reavaliar dor; se intensa e refratária, discutir cirurgia conservadora com equipe experiente, sempre ponderando impacto na reserva.

Meses 7–12:
– Transferência de embrião em ciclo otimizado, especialmente se houver adenomiose.
– Se não houve gravidez, reavaliar hipóteses (trompas, receptividade endometrial, qualidade embrionária) e ajustar a estratégia.
– Considerar preservação adicional de óvulos/embriões se o tempo até a gestação precisar ser estendido.

Perguntas essenciais para a consulta médica

– Com base na minha idade e AMH, quanto tempo devo tentar espontaneamente?
– Minhas trompas estão pérvias e o espermograma é favorável à IIU?
– Em meu caso, os benefícios da cirurgia superam os riscos à reserva ovariana?
– Qual a estimativa de taxas de sucesso com IIU e FIV no meu perfil?
– Devo considerar congelar óvulos antes de qualquer cirurgia?
– Há sinais de adenomiose? Isso muda a estratégia de transferência embrionária?
– Como monitorar dor e ajustar o tratamento sem atrasar o plano reprodutivo?

Aspectos emocionais e suporte ao casal

Infertilidade e dor crônica podem esgotar o emocional. Não é fraqueza sentir medo ou frustração; é humano. Uma abordagem que inclua saúde mental melhora adesão ao plano, qualidade do relacionamento e, indiretamente, resultados.

Comunicação, terapia e rede de apoio

– Combine expectativas e papéis no casal: quem liga para o laboratório, quem organiza documentos, como dividir tarefas nos dias de procedimento.
– Busque terapia individual ou de casal quando a ansiedade ou a dor estiverem desorganizando a rotina.
– Participe de grupos de apoio confiáveis; ouvir outras histórias ajuda, mas lembre-se de que cada trajetória é única.
– Práticas mente-corpo (yoga suave, respiração, meditação) podem reduzir estresse e melhorar a percepção da dor.

Não subestime o efeito da compaixão consigo mesma. Um plano reprodutivo bem desenhado soma ciência e acolhimento.

Erros comuns que atrasam o positivo (e como evitá-los)

– Adiar a avaliação por muito tempo: após 6–12 meses de tentativas, procure avaliação, especialmente com mais de 35 anos.
– Operar endometriomas sem plano reprodutivo: cirurgias sucessivas podem reduzir a reserva. Discuta congelamento de óvulos antes.
– Apostar por muitos meses apenas em anti-inflamatórios e supressores hormonais: essas terapias tratam dor, mas não aumentam chances de gravidez enquanto usadas, pois suspendem ovulação.
– Não investigar o fator masculino: alterações no sêmen são frequentes e mudam a estratégia.
– Ignorar adenomiose: pode exigir preparo do endométrio e ajustes na transferência embrionária.
– Desistir cedo demais da FIV após um ciclo: muitas vezes são necessários 2–3 ciclos para um desfecho de nascido vivo, especialmente com endometriose e baixa reserva.

Ao evitar esses pontos, você acelera o caminho entre endometriose fertilidade e o objetivo de ter um bebê em casa.

Checklist rápido para levar à consulta

– Idade, tempo de tentativas e histórico de tratamentos prévios.
– Resultados de AMH, contagem de folículos antrais e ultrassonografias (com datas).
– Registro de dor (intensidade, dias do ciclo, gatilhos e alívio).
– Lista de medicamentos e suplementos em uso.
– Exames do parceiro (espermograma, histórico de saúde).
– Preferências e limites do casal (tempo, custos, disponibilidade para procedimentos).

Estar preparada(o) torna a conversa objetiva e o plano mais assertivo.

O que você pode começar hoje

– Marcar consulta com especialista em reprodução para avaliar seu cenário de endometriose.
– Organizar exames e laudos anteriores em um único arquivo.
– Iniciar ajustes de estilo de vida: alimentação, sono e atividade física regular.
– Programar relações nas janelas férteis por 2–3 ciclos, se essa for a estratégia atual.
– Conversar sobre preservação de fertilidade se há endometriomas ou cirurgias à vista.

Ao alinhar ciência, comportamento e cuidado com a dor, você melhora suas chances em cada etapa. Endometriose fertilidade não é sinônimo de impossibilidade; é um convite a um plano inteligente, com decisões oportunas e acompanhamento especializado.

Encerrar adiamentos é o primeiro passo. Agende sua avaliação com um(a) especialista em reprodução humana, leve este checklist e transforme seu plano em ação já no próximo ciclo.

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Dra. Juliana Amato

Dra. Juliana Amato

Líder da equipe de Reprodução Humana do Fertilidade.org Médica Colaboradora de Infertilidade e Reprodução Humana pela USP (Universidade de São Paulo). Pós-graduado Lato Sensu em “Infertilidade Conjugal e Reprodução Assistida” pela Faculdade Nossa Cidade e Projeto Alfa. Master em Infertilidade Conjugal e Reprodução Assistida pela Sociedade Paulista de Medicina Reprodutiva. Titulo de especialista pela FEBRASGO (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia) e APM (Associação Paulista de Medicina).

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